A MODERNIZAÇÃO DO TERRITÓRIO E OS CONFLITOS POR TERRA E ÁGUA NO BAIXO JAGUARIBE - CEARÁ

FRANCISCO ANTONIO DA SILVA

Co-autores:
Tipo de Apresentação: Oral

Resumo

O trabalho analisa a relação entre a "modernização do território" e os conflitos por terra e água na região do Baixo Jaguaribe, interior do estado do Ceará, centrado nos perímetros irrigados Jaguaribe-Apodi (localizado nos municípios de Limoeiro do Norte e Quixeré) e Tabuleiros de Russas (nos municípios de Russas, Limoeiro do Norte e Morada Nova). Esses projetos de irrigação, projetados e executados pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), visam o estabelecimento das condições necessárias para o desenvolvimento do agronegócio e fazem parte de um conjunto de ações que são complementadas pelo governo do estado do Ceará de forma a promover a infraestrutura necessária ao desenvolvimento do capitalismo no campo através do incentivo ao agrohidronegócio. Esse processo de modernização do território vem acompanhado da ampliação e acirramento dos conflitos por terra e água, tendo em vista que a infraestrutura hídrica instalada tem por fim atender às grandes empresas agrícolas da região e às empresas (siderúrgicas e petroquímicas, por exemplo) instaladas no Porto do Pecém, localizado no município de São Gonçalo do Amarante, região metropolitana de Fortaleza. A expropriação e expulsão dos camponeses de seus locais de moradia e trabalho, assim como a contaminação das águas e dos solos pelo uso indiscriminado de agrotóxicos são alguns dos resultados da intervenção do Estado e das grandes empresas agrícolas. A região do Baixo Jaguaribe, tradicionalmente marcada por conflitos territoriais entre camponeses e latifundiários, assentava a organização e produção da vida em torno da agricultura camponesa, especialmente as atividades agropecuárias de sequeiro, baseada na policultura e na criação de animais de pequeno porte. As mudanças ocorridas nas últimas décadas evidenciaram as diferenças e incompatibilidades entre a agricultura de base camponesa e a empresarial, resultando na luta em torno de projetos distintos, um voltado para a reprodução das condições materiais da existência, outro, dedicado à acumulação e reprodução do capital. Numa perspectiva benjaminiana, o presente trabalho busca remover dos escombros do passado as lutas e as alternativas ao agronegócio gestadas pelas populações vítimas das ações de modernização do território na região do Baixo Jaguaribe como possibilidade de construção de uma narrativa histórica fundada na história dos vencidos que aponte para a compreensão crítica do presente e dos projetos vencedores, capitaneados pelo Estado em favor de segmentos de classe, como o dos empresários do agronegócio. A postura metodológica adotada é a do materialismo histórico, tendo em vista que "O método de análise está vinculado a uma concepção de realidade, de mundo e de vida, funciona como mediador no processo de entender a estruturação, o desenvolvimento e a transformação dos fenômenos sociais, dos objetos que investigamos" (BEZERRA NETO; BEZERRA, 2010, p. 253). Na perspectiva de Benjamin (1985, p. 224), "articular historicamente o passado não significa conhecê-lo ´como ele de fato foi'. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo. Cabe ao materialismo histórico fixar [apreender] uma imagem do passado tal como ela se apresenta, no momento do perigo, ao sujeito histórico, sem que ele tenha consciência disso. O perigo ameaça tanto a existência da tradição como os que a recebem. Para ambos o perigo é o mesmo: entregar-se às classes dominantes, como seu instrumento". Nesse sentido, a modernização territorial no Baixo Jaguaribe, a partir do estudo desses dois projetos de irrigação e seguindo as pistas de Henri Acselrad (2004), é caracterizada pelo processo de apropriação material dos recursos do território - como a terra e a água; de apropriação técnica, a partir dos processos produtivos, e de apropriação cultural ou simbólica, através da produção e difusão de sentidos para a reterritorialização do lugar na perspectiva do capital.