O ESCRITOR MALDITO E O “DIÁRIO DO HOSPÍCIO”: A EXPERIÊNCIA MANICOMIAL DE LIMA BARRETO A PARTIR DA ESCRITA DE SI.

ADELIANA ALVES BARROS

Co-autores:
Tipo de Apresentação: Oral

Resumo

O interesse pelas trajetórias individuais por parte dos historiadores não é algo novo. Porém, o olhar que deve ser lançado a essas trajetórias e os sujeitos que compõem o enredo das narrativas históricas em forma de biografia já não são mais os mesmos. A história voltada à política, escrita de maneira linear, que buscava a homogeneidade das intenções e ações dos sujeitos investigados, chamada de positivista, a qual o gênero biográfico centrava sua atenção, caiu em desuso na historiografia. A história ao se debruçar sobre a biografia empreendeu um trabalho mais rigoroso, onde buscou ressaltar as tensões existentes entre a ação humana e as estruturas sociais, pensando o processo com o sujeito, estabelecendo uma relação dialética entre o sujeito e o seu meio. A escrita biográfica traz à história a possibilidade de conhecer as experiências de mulheres e homens antes não escutados. Os sujeitos devem ser compreendidos a partir de seus dilemas, possibilidades de inserção e usos dos mecanismos sociais, dos significados dados ao meio em que viveram e das relações que construíram. A escrita autobiográfica relaciona-se diretamente com a memória. Lembrança transformada em narrativa, essa que relata a própria experiência de vida selecionando memórias, utilizando a imaginação e o olhar individual do autor acerca do acontecimento. Essas lembranças são estruturadas a partir do tempo presente, que é essencial para a escolha do que se vai escrever e falar sobre o que foi vivido. Podemos pensar numa renegociação e reinvenção da experiência relatada através de livros, diários e cartas. O escritor Lima Barreto, internado duas vezes no Hospício Nacional de Alienados no Rio de Janeiro nos anos de 1914 e 1919, escreveu nas dependências do espaço asilar um diário intitulado "Diário do Hospício" e que posteriormente foi transformado em romance "O Cemitério dos vivos", nos falando em tom de desabafo acerca do "espetáculo do hospício", descreve suas internações e traz anotações que expõem a sua experiência, apontando suas impressões e confissões acerca da instituição psiquiátrica, da loucura e do seu dia a dia na casa dos "loucos" e qual o papel da sociedade da Primeira República neste processo. Não se prende a uma escrita temporalmente linear.  Revelando aspectos desse verdadeiro "cemitério de vivos", Lima Barreto fez de sua escrita uma estratégia de "sobrevivência" ao manicômio e "fabricou" uma versão de sua vida produzindo um raro documento para a história ao falar sobre a experiência do "louco".