Este artigo analisa as representações sobre saúde e doença entre estudantes africanos residentes em Fortaleza-CE, no contexto da migração estudantil internacional. No contexto de diferentes estratégias, os africanos saem de seus respectivos países com enormes expectativas acadêmicas em relação ao Brasil, devido ao maior nível de desenvolvimento econômico, tecnológico e de produção acadêmica, alimentando esperanças de facilidade de inserção por conta da língua portuguesa e culturas em comum trazidas pelos escravos. Chegados à Fortaleza, vivenciam verdadeiros dramas sociais (Turner, 2005), sozinhos têm que "se virar" para aceder aos serviços do SUS. São emblemáticos os casos das mortes de dois estudantes bissau-guineense ocorridas em 2014, que abalaram a comunidade africana em Fortaleza. Para compreender tais representações utilizo como aportes teóricos o modelo explicativo (Kleinman, 1980) e a noção de experiência da doença (Alves, 1993). Utilizando o método etnográfico com registro sistemático no caderno de campo, desenvolvi entrevistas abertas com dez estudantes africanos sobre suas concepções e experiências acerca da saúde e, dos episódios de doença. A maioria dos estudantes se considera saudável, ainda que tenha tido episódios de doença marcantes - infecções alimentares, dengue - que os obrigou a internamentos ou a ficarem acamados em casa. Durante os processos de adoecimento, muitos africanos não conseguem aceder ao SUS por conta das filas de espera e, relatam dificuldades de comunicação com os profissionais de saúde, em algumas situações que refletem a existência de racismo institucional. A partir de suas histórias de vida, percebo que em África esses sujeitos dispunham de diversos sistemas culturais e de saúde - tradicional, popular, religioso e biomédico - coexistindo em simultâneo e, tinham "garantido" o acesso à saúde por meio de redes clientelares através de familiares e de conhecidos. Já no Brasil, suas narrativas apontam dificuldades no acesso às unidades de saúde, vivenciando situações de desproteção social e, a saúde passa a ser motivo de preocupação e temores de adoecimento. Na diáspora, além dos sintomas físicos das doenças, os africanos passaram a ser acometidos de sofrimentos de ordem emocional, psíquica e clínica, ligados ao desenraizamento (Weil, 1996) - saudades, depressão e stress - com os quais não dispõem de dispositivos para o seu enfrentamento. Entretanto, mesmo diante de tais dificuldades, a imigração estudantil em território brasileiro é representada como um estado que os africanos parecem prolongar indefinidamente ou, um estado duradouro que se gosta de viver com intenso estado de sofrimento de provisoriedade, resgatando a dupla contradição de Sayad (1998).