Maracanaú é uma cidade da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) que a partir de 1980 passou por um intenso processo de industrialização e urbanização. As mudanças suscitaram uma grande discussão e mobilização de movimentos e moradores quanto a memória dos lugares (nomes de ruas, praças, bairros, escolas, estátuas, eventos) e a preservação ou destruição do patrimônio cultural. Um dos grupos que me chamou bastante atenção foram os leitores do jornal folha de Maracanaú da coluna Carta do Leitor. Essa coluna periódica nos mostra que os consumidores, leitores, pessoas comuns (CERTEAU) não são passivas ante as transformações socioculturais e os debates sobre memória, identidade e patrimônio do município. Ao contrário, os moradores, antigos e migrantes, fazem questão de opinar e marcar suas posições, analisando o cotidiano, comportamentos e acontecimentos a partir de suas referências histórias, afetivas e identitárias. O que podemos inferir foi uma disputa ou mesmo distintas formas de lidar com a memória e o cotidiano multifacetado do local. Dentre aqueles que escreveram para o periódico, o grupo dos moradores antigos são os mais atentos e críticos em relação a ideologia do progresso que, segundo um dos leitores, "derruba e aniquila" os bens, assim como realizam uma defesa na valorização da memória dos antigos e moradores ilustres do lugar, chegam mesmo a sugerir que a população deveria votar em candidatos que vivem e têm relação histórica com a cidade. Enquanto isso, os moradores migrantes também demonstraram preocupação com o patrimônio da cidade, mas foram mais flexíveis quanto ao dever de memória e de identidade. Os migrantes não negam suas duplas filiações identitárias e quando analisam Maracanaú e seu cotidiano, o fazem considerando suas origens, reais ou idealizadas. Portanto, a coluna Carta do Leitor é uma fonte pertinente para discussão das tramas (VEYNE) da população com a cidade.