Muitos autores do crescente campo dos Estudos Surdos reproduzem uma narrativa simplista acerca de uma "história dos surdos do mundo" sintetizada em etapas: Na Antiguidade, as pessoas com surdez eram desprezadas. A partir do século XVIII, as línguas de sinais foram valorizadas e os surdos puderam viver sua era de ouro, mas foram novamente oprimidos e obrigados a oralizar por decisão de um congresso em 1880. Finalmente, são "resgatados" cem anos depois quando as línguas de sinais foram reconhecidas novamente. Este trabalho aponta algumas incoerências e anacronismos dessa narrativa tradicional, a partir de uma abordagem crítica sobre a experiência de pessoas surdas enquanto sujeitos sociais ativos, e tenta relacionar tais experiências aos períodos históricos em que ocorreram. Nesse sentido, utiliza-se da pesquisa qualitativa para investigar momentos em que pessoas surdas se destacaram como protagonistas apresentando alguns exemplos históricos na realidade brasileira: a reinserção de ex-alunos do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) como funcionários durante o século XIX, uma rebelião de alunos do mesmo instituto ocorrida em 1950, e a criação das associações de surdos naquela mesma década. A proposta deste texto é analisar conceitos como "povo surdo" e "identidade surda" baseado nas obras de Strobel (2016), Hall (2001) e Rocha (2007, 2010) debatendo a impossibilidade de construir uma única história dos surdos do mundo. Conclui-se que a partir da valorização das línguas de sinais e do desenvolvimento das tecnologias da comunicação, pessoas surdas puderam complexificar suas relações sociais e aumentar o alcance de ideias, que antes estavam restritas a poucas pessoas usuárias de Libras. Dessa maneira, investir em pesquisas históricas de comunidades específicas de surdos contribuirá para a construção de um debate acadêmico mais aprofundado no campo dos Estudos Surdos.