Há algum tempo a historiografia brasileira tem estudado o papel político exercido pela grande imprensa, tanto na defesa de interesses político-partidários, quanto na difusão de ideias e conceitos políticos. Nesta linha de abordagem, porém, construiu-se uma forte e persistente tradição que concebe os jornais como instância subordinada ao universo político e como mero reprodutores do discurso dos "poderes dominantes" (SODRÉ, 1986; CAPELATO, 1980; SKIDMORE, 1966). Entretanto, mais recentemente, muitos pesquisadores têm contrariado esta interpretação, tentando demonstrar que, mais do que instância subordina e reprodutora de ideias e conceitos políticos externos, os jornais muitas vezes exercem um papel protagonista na condução dos processos e na construção de hegemonias sociais (MARIALVA, 2010; ABREU & LATTMANN-WELLTMANN, 1996). Vinculando-se a esta última corrente e inspirando-se na teoria dos campos sociais de BOURDIEU (1996) e na abordagem dos conceitos políticos proposta por ROSANVALLON (2010), o trabalho que propomos irá problematizar a visão mais tradicional da imprensa como instância subordinada e reprodutora de discursos/ideias políticas, procurando vê-la como um espaço de produção de sentido que tem uma especificidade própria e que procura defender seus próprios interesses na "esfera pública". Para tanto, iremos tomar como objeto de análise a relação da grande imprensa brasileira com o Segundo Governo Vargas, buscando avaliar a forma como ela se posicionou frente às mais importantes medidas/projetos deste governo (Petrobras, BNDES, aumentos do salário mínimo) e aos principais partidos do período (PSD, PTB, UDN). Nosso objetivo é demonstrar a maneira estratégica e, por vezes, sinuosa com que alguns jornais cariocas tradicionalmente considerados como liberais (JB, O Globo, Correio da Manhã, etc.) construíam discursivamente o governo de Getúlio, os partidos supracitados e a sua própria inserção na arena de debates. Neste caso, mais do que mera subordinação a partidos e/ou oposição intransigente ao Governo Vargas, entramos posicionamentos altamente estratégicos que se consolidam ou oscilam a partir de uma constelação variada de fatores (interesse dos patrocinadores, relações com posição partidárias, vinculação e/ou identidade tradicional com doutrinas, relação com o público leitor).