Introdução: A palavra prostituição vem do verbo latino prostiture, que significa se expor publicamente, pôr a venda, ou seja, é usar o corpo como mercadoria, mediante remuneração (GAULTHIER, 2011; MISKOLCI, 2012). Embora os perfis das profissionais do sexo sejam heterogêneos, usualmente as pessoas que a praticam são provenientes de classes socioeconômicas menos favorecidas e que possuem menor poder de negociação do uso de métodos contraceptivos com os seus clientes. Assim, por esta razão, estão mais vulneráveis a situações de risco, tais como, gestações indesejadas, abortamentos clandestinos e Infecções Sexualmente Transmitidas (ISTs), entre elas o HIV/aids (OLIVEIRA, 2008; MOREIRA, 2012). Este estudo é relevante visto que o não uso ou o conhecimento deficiente acerca dos métodos contraceptivos aumentam a vulnerabilidade das profissionais do sexo. Nessa perspectiva, pretende-se contribuir com a agregação de informações sobre essa temática para que os profissionais da saúde possam ter maior êxito ao abordar essa população, bem como também ao programar e planejar estratégias que possam reduzir os riscos à saúde que são inerentes a esta profissão. Em face do exposto, este estudo tem por objetivo analisar o conhecimento e o uso de métodos contraceptivos por profissionais do sexo que atuam no município de Parnaíba- PI. Metodologia: Trata-se de estudo do tipo de abordagem qualitativa realizado com prostitutas que exercem suas atividades laborais em quatro bordéis do município de Parnaíba-PI. Os critérios de inclusão para participação da pesquisa foram: profissionais do sexo com idade superior a 18 anos e tempo mínimo de atuação na prostituição de um ano. . A coleta de dados ocorreu nos meses de março e abril de 2015 nos prostíbulos da zona urbana da cidade de Parnaíba- PI. Após a abordagem e convite à participação na pesquisa, foram aplicadas entrevistas individuais semi-estruturadas em um local reservado do estabelecimento onde as mulheres trabalhavam, as quais foram gravadas por meio de aparelho digital. As entrevistas com as prostitutas se encerraram somente quando foram obtidos dados suficientes para a pesquisa e quando as falas das depoentes começaram a se repetir, demonstrando assim a saturação das informações. Após a transcrição dos relatos na íntegra, os seus conteúdos foram analisados à luz da obra de Bardin (2009). Convém ressaltar que todas as participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e o projeto do qual este estudo faz parte foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Piauí (UESPI) e aprovado sob CAAE de número 42549615.0.0000.5209. Resultados e Discussão: A amostra constituiu-se de 12 prostitutas que exercem suas atividades em quatro bordéis na cidade de Parnaíba-PI. A faixa etária das participantes oscilou entre 19 e 35 anos. Quanto ao nível de escolaridade a maioria referiu possuir ensino médio incompleto. Quanto ao tempo de exercício na profissão, o menor foi de um ano e dois meses e o de maior duração foi 18 anos. As mulheres mostraram conhecimento razoável a respeito dos métodos contraceptivos e referiram o seu uso constante, em especial os métodos de barreira, como se pode observar no seguinte depoimento: "Se é masculino ou feminino tanto faz, quando ele não quer usar o masculino eu boto o feminino". Os mais apontados pelas mulheres para a prevenção da gravidez indesejada foram a pílula contraceptiva, o preservativo masculino e a laqueadura das trompas. No que se refere ao uso da pílula de emergência, esta é utilizada ocasionalmente quando o preservativo rompe ou ainda quando a mulher esquece de tomar o contraceptivo hormonal oral, conforme se observa na fala que se segue: "A pílula do dia seguinte é tipo nas vezes que acontece da camisinha estourar e o anticoncepcional tiver irregular eu corro para isso". Todas as mulheres relataram o uso constante do preservativo, mesmo que associado a outro método para prevenir a gravidez indesejada, o que corrobora com pesquisa realizada com 69 mulheres profissionais do sexo em Fortaleza-CE em que o uso do preservativo foi citado por quase 74,0% delas como forma de prevenção contra ISTs (SILVA et al., 2008). Ressalta-se a preferência das participantes deste estudo pelo preservativo masculino, o qual é fornecido pela casa de prostituição, juntamente com o lubrificante, como se pode observar no seguinte depoimento: "Com certeza uso o masculino mesmo, é fornecido aqui no bar, e às vezes o cliente traz". Algumas entrevistadas referiram desconfiar do cliente que deseja a prática sexual sem o uso da camisinha por desconhecer o seu passado e as suas relações anteriores, atrelando à essa atitude uma maneira de propagar a doença, conforme constatado na seguinte fala: "Tem que está sempre atenta, você não pode confiar não. Já aconteceu vários casos comigo de tirarem a camisinha". Em pesquisa conduzida com prostitutas do município de São Carlos-SP as mulheres compartilhavam do mesmo sentimento de incerteza e insegurança quando recebiam a proposta de realizar o sexo desprotegido. Em alguns relatos elas afirmam não ceder a esse tipo de investida do cliente em pagar um valor acima do cobrado com a intenção de realizar o sexo desprotegido, uma vez que não é possível prever se o mesmo costuma utilizar o preservativo em todas as suas relações sexuais e ainda se está infectado com alguma IST, confirmando os resultados encontrados nesta investigação (SOUSA, 2012). Todavia, mesmo quando o cliente aceita usar o preservativo elas não estão em total segurança, visto que existe a possibilidade da camisinha romper ou até mesmo de ser retirada pelo cliente durante o ato sexual com intuito de ejacular dentro da vagina da mulher, segundo relatado por uma das depoentes: "A questão de a camisinha estourar, tem engraçadinho que tira, já aconteceu vários casos comigo de tirarem a camisinha, mas é uma raiva tão grande". O uso de preservativos mesmo com o parceiro fixo não cliente foi referido por algumas participantes, o que reforçou novamente a ideia de prevenção de doenças. Este resultado vai em confronto com os apresentados em estudo realizado em Portugal que mostrou que o uso do preservativo é abandonado quando se estabelece uma relação de namoro e as prostitutas se encontram emocionalmente envolvidas (OLIVEIRA, 2011). Com base no exposto, é evidente que o preservativo previne as ISTs se usado corretamente e em todas as relações sexuais, sendo ela vaginal, oral e/ou anal. Utilizá-lo esporadicamente, não utilizá-lo, ou utilizá-lo apenas com clientes que não passam confiança, não previne a transmissão de doenças. Conclusão: Os resultados demonstraram como as prostitutas estão utilizando o preservativo em seu ofício. Parcela expressiva delas afirma o uso e a preocupação com os métodos contraceptivos com intuito de prevenir uma IST, bem como gestações indesejadas. Deste modo, consideramos que esta pesquisa trouxe para o conhecimento da Enfermagem e dos profissionais de saúde em geral uma realidade que necessita ser mais explorada e abordada, pois se trata de um grupo específico que necessita de informações e apoio. O enfermeiro pode ser um agente facilitador neste processo atuando como educador em saúde e, quando necessário, na assistência às prostitutas quando em situação de gravidez indesejada e aborto. Sugere-se a realização de outros estudos em relação à temática, sendo esses qualitativos ou quantitativos, na busca de outras vivências para que seja possível compreender um pouco mais o cenário da prostituição.
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa, Portugal; Edições 70, LDA, 2009.
GAULTHIER J. Prostitution, sexual autonomy, and sex discrimination. Hypatia, v. 26, n. 1, p. 166-186, 2011.
MISKOLCI, R. Teoria querer: um aprendizado pelas diferenças. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.
MOREIRA, I. C. C. C.; MONTEIRO, C. F. S. The violence in everyday of prostitution of women: invisibility and ambiguities. Revista Latino-Americana de Enfermagem, v. 20, n. 5, p. 954-960, 2012.
OLIVEIRA, A. O mundo da prostituição de rua: trajetórias, discursos e práticas. Um estudo etnográfico. Tese de Doutorado em Psicologia. Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto. Porto. 2008.
____________. Andar na vida: prostituição de rua e reação social. Coimbra: Almedina, 2011.
SILVA, R.M., et al. Saberes e práticas de prostitutas acerca dos métodos contraceptivos. Revista Baiana de Saúde Pública, v. 32, n. 2, p. 177, 2008.
SOUSA, F. A noite também educa: compreensões e significados atribuídos por prostitutas à prática da prostituição. 2012. Tese de Doutorado. Tese de doutorado em Educação, PPGE/Universidade Federal de São Carlos.