A DEMANDA ESPONTÂNEA COMO UM DISPOSITIVO DE AMPLIAÇÃO DO ACOLHIMENTO: RELATO DE EXPERIÊNCIA

AMANDA FIGUEIRA RODRIGUES

Co-autores: JULIANA WANDERLEY SILVEIRA, DANIELE VASCONCELOS FERNANDES VIEIRA e YÊRÊCÊ ATHAYDE PIMENTEL
Tipo de Apresentação: Oral

Resumo

 

Introdução


O acolhimento à demanda espontânea (DESP) na atenção básica é uma proposta do Ministério da Saúde (MS) que visa acolher, escutar, problematizar e reconhecer como legítima a demanda de saúde do usuário. O acolhimento encontra-se implantado em 81,2% na região nordeste segundo dados da avaliação externa do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB).

A maioria das demandas apresentadas pela comunidade pode ser atendida e resolvida na atenção básica, sem precisar o usuário ir a um serviço de maior complexidade, como cefaleia ou tontura; pessoa com ardência ou dor ao urinar; criança com febre; mulher com sangramento genital, entre outros, desfazendo a imagem de que a unidade básica de saúde só direciona o cuidado para a prevenção de doenças (BRASIL, 2013). Diversas pesquisas indicaram que as unidades de atenção primária a saúde, se funcionarem adequadamente de forma resolutiva e humanizada, são capazes de resolver 85% dos problemas de saúde da população.

Porém, organizar a DESP é um grande desafio para as equipes de saúde da família, pois os usuários chegam à Unidade de Saúde trazendo necessidades biopsicossociais e devem receber um atendimento humanizado, que seja capaz de atender as suas expectativas (CARVALHO, TERTULIANO, 2015).

O objetivo desse trabalho foi realizar a escuta e resolução de problemas apresentados pelos usuários em situações agudas que necessitem de intervenções pontuais, com fins a desobstruir os fluxos de pessoas nas emergências hospitalares e Unidades de Pronto Atendimento (UPA's).

Metodologia


Este estudo trata-se de um relato de experiência sobre a atuação do enfermeiro na demanda espontânea (DESP) vivenciada e observada pelas acadêmicas de enfermagem, durante o período do internato do curso de graduação em enfermagem, da Universidade Estadual do Ceará em uma Unidade de Atenção Primária em Saúde (UAPS), no município de Fortaleza, Ceará.

O relato em um primeiro momento problematiza as funções do enfermeiro na demanda espontânea em um unidade de atenção primária em saúde e, em um segundo momento, descreve como se desenvolveu as experiências das internas, tutoradas pela enfermeira. Participaram duas internas de enfermagem do último ano da graduação, uma enfermeira tutora do campo de prática e uma professora supervisora da Graduação, no período de fevereiro a abril de 2016. As escalas na DESP foram organizadas em conjunto com a enfermeira tutora e as internas que se dava em Três vezes na semana, no turno da tarde, seguindo o cronograma pré-estabelecido de atividades da tutora na UAPS.

Resultados e Discussão


1.    Problematização das funções do enfermeiro na Demanda Espontânea em uma Unidade de Atenção Primária em Saúde

Há uma grande dificuldade da população em compreender os benefícios e a importância de uma saúde baseada em ações preventivas. Com a chegada da DESP é presenciada dificuldades em relação a essa prática, pois os usuários procuram a unidade de saúde, onde é encontrado facilidade de atendimento na Demanda Espontânea perante um evento agudo apresentado por ele. Isso acontece devido à demora dos agendamentos de consultas rotineiras, onde seriam dados os devidos acompanhamentos e orientações de Promoção à Saúde.

Essa atual realidade descaracteriza a proposta da atenção primária tornando a unidade básica de saúde um verdadeiro centro de pronto-atendimento, onde infelizmente também são solicitados pelos usuários renovações de receitas médicas.

Os autores Rodrigues e Lachno (2014) afirmam que há um grande desconforto dos trabalhadores com o dispositivo do acolhimento, somadas a incompreensão de suas potencialidades à grande demanda de usuários na ESF, o que faz com que a equipe se ressinta de não estarem fazendo o trabalho de prevenção e promoção à saúde ou mesmo se sintam trabalhadores de Pronto Atendimento, exercendo uma clínica desqualificada.

No acolhimento, o enfermeiro é o profissional que atua como porta de entrada para a DESP, pois a partir dele é realizado o atendimento do usuário com uma escuta qualificada, com um olhar holístico e, principalmente analisando as suas necessidades ou não de um atendimento de urgência, fazendo a classificação de risco de acordo com o Protocolo de Manchester, que é um sistema de triagem implementado para assegurar que os doentes sejam observados por ordem de necessidade clínica e não por ordem de chegada, dando-lhe os encaminhamentos.

 O enfermeiro da DESP deverá ainda desenvolver habilidades para avaliar, registrar correta e detalhadamente a queixa; saber trabalhar em equipe; ter raciocínio clínico e agilidade mental para a tomada de decisões; assim como ser capaz de fazer os devidos encaminhamentos na rede assistencial para que seja efetivada a continuidade do cuidado (SILVA; BARROS; TORRES, 2012).

O acolhimento não é sinônimo de triagem para a consulta médica, pois a escuta eficaz pode proporcionar novas alternativas que prescindam a consulta médica, racionalizando a sua utilização. Além disso, o acolhimento não deve ser visto como mais um obstáculo a ser derrubado para que o usuário chegue à assistência (RODRIGUES; LACHNO, 2014).

 O acolhimento à Demanda Espontânea vem provocando mudanças na organização do trabalho, nas relações das equipes e nos modos de cuidar, ampliando a capacidade clínica da equipe de saúde para que desenvolva capacidades de avaliar riscos de forma qualificada e resolutiva (Brasil, 2006).

2.    Relatando a experiência do internato em enfermagem na DESP em uma Unidade de Atenção Primária em Saúde

Nas Unidades de Atenção de Atenção Básica, no Município de Fortaleza, o Acolhimento à Demanda Espontânea (DESP) é um serviço que funciona de segunda à sexta das 7 horas da manhã até às 19 horas da noite.

Nesse serviço, a enfermeira anota as queixas, faz o exame físico, avalia de acordo com o Protocolo de Manchester e se as suas demandas estiverem no elenco das competências do profissional enfermeiro, ela já o orienta, prescreve de acordo o protocolo de prescrição de enfermagem do município e o libera ao domicílio ou fará o encaminhamento ao profissional médico do acolhimento na ausência deste, faz os encaminhamentos adequados a outras unidades de atenção básicas próximas a de origem ou a outra unidade de maior nível de complexidade, solicitando uma contra referência, possibilitando assim a formação ou o fortalecimento do vínculo com este usuário.

A interna de enfermagem, após observar o modo como a enfermeira tutora age se torna apta a realizar o trabalho, mas sempre com a tutora ao lado, para esclarecimento de qualquer dúvida. Se tornando responsável pelo atendimento, acolhendo o usuário e relatando seu problema no seu prontuário eletrônico, fazendo orientações de saúde e prescrevendo medicamentos que podem ser prescritos pela enfermeira da Estratégia de Saúde da Família (ESF). No começo, a tutora interage mais com o usuário, e quando percebe que a interna está mais confiante apenas observa e a deixa a vontade para agir com autonomia no atendimento.

Conclusão


A DESP é importante para aproximar o usuário da rede pública ao serviço de uma UAPS, desobstruindo os serviços secundários e terciários de saúde de demandas que não tem o perfil dos mesmos.

Porém, foi observado que essa abordagem não é vista de forma positiva por alguns profissionais da rede primária de saúde, pois eles acreditam que a DESP desestruturou a proposta da ESF, tirando o foco dos programas de saúde e tornando a UAPS um pequeno serviço de urgência/emergência, sobrecarregando os profissionais, principalmente os enfermeiros, fragilizando, de um modo geral, o vínculo entre profissional e usuário.

E, no tocante aos usuários, compreende-se que os mesmos terão apenas seus sintomas tratados de forma pontual e emergencial, pois, além de nem sempre os mesmos pertencerem ao território adscrito, não há tempo e nem disponibilidade de profissionais para investigar as causas e supervisionar as contrarreferências, nas ocasiões em que são referenciados para outras unidades, em diferentes níveis de atenção em saúde.