IDEAL CAVALEIRESCO: CÓDIGO DE CONDUTA E VALORES CRISTÃOS

CLESIVALDO ARÁUJO SILVA JÚNIOR

Co-autores: PROF. DR. GLEUDSON PASSOS CARDOSO
Tipo de Apresentação: Oral

Resumo

Universidade Estadual do Ceará

Autor: Clesivaldo Araújo Silva Júnior

Coautor: Prof. Dr. Gleudson Passos Cardoso

Ideal Cavaleiresco: Código de Conduta e Valores Cristãos

Palavras-chave : Cavalaria, Cristãos e Conduta

A Igreja buscava assim transmitir aos cavaleiros os valores de justiça e paz, pois a preocupação com um possível afastamento desses novos fiéis iria de encontro com o que se ficou conhecido como ideal da cavalaria e os valores cristãos de um "bom homem".

A cavalaria durante a aproximação com o cristianismo, ganhará não só um caráter social (o posto de cavaleiro só era admito aqueles que fizessem parte do contexto da nobreza), mas um caráter ético, como regras de conduta que vão deste o seu orgulho como cavaleiro, até o seu papel como "protetor" de quem necessitasse da sua "espada cristã". Aos poucos a cavalaria viria a se tornar "A Cavalaria", não mais se restringindo a uma formação guerreira, mas um ideal, um valor, um código de condutas. Será com a aproximação entre os aspectos religiosos e éticos que a cavalaria se tornará "mais cristã".

Este ideal religioso e ético será a base da obra do filosofo Ramon Llull sobre a construção cristã de um exercito temente a Deus, a partir de uma nova ideologia cavaleira que trazia aspectos como os sacramentos e as investiduras (benção das armas) que faziam uma ligação mais concreta entre o ideal de cavaleiro, sua honra e os interesses da igreja por traz desses cavaleiros mais cristãos.

Com as Cruzadas, o combater em nome de Deus foi caracterizado por novos ritos entre eles a cerimônia da investidura onde o novo guerreiro recebia suas armas abençoadas e passava a ter responsabilidade sobre si, pelos outros e claro, pela Igreja.

 Nesse sentido, trabalharemos com o modelo de cavaleiro cristão elaborado por Ramon Llull, que no livro "O Livro da Ordem de Cavalaria", um manual didático-pedagógico, discorreu sobre a função da importância dos ensinamentos cristãos àqueles que desejassem se tornar "bons" cavaleiros, e assim compreender a função da cavalaria na Idade Média durante os séculos XIII e XVI, não só com uma característica militar, mas social e voltada para os interesses da fé cristã.

Deste modo, pretendo verificar a formação do ideal cavalheiresco, que é construído a partir da ligação entre os aspectos da ideologia cristã e os valores de conduta da nobreza, que tinham como principal objetivo, reaproximar a cavalaria do papel de Ordem ligada a igreja.

Na obra do filosofo Ramon Llull "A Ordem de Cavalaria" que será a nossa fonte de pesquisa, pois se tratando de uma obra do século XIII, traz os principais aspectos sobre o modelo de cavaleiro ideal para a sociedade e para a Igreja.

 Em uma sociedade dita religiosa, como o foi a Idade Média, as obras de cunho religioso se entrelaçavam com as condutas a serem exercidas pelos seus seguidores, neste caso fazendo do aspecto da cavalaria um código consuetudinário a ser cumprido.

A cavalaria, por mexer até hoje com nosso imaginário, graças a esses textos que construíram a imagem de um cavaleiro como Herói romantizado, é muitas vezes retratada em obras cinematográficas e em produções historiográficas de forma voltada ao ambiente que retrata a cavalaria em si, mas o nosso intuito aqui não será demonstrar o ambiente dos cavaleiros, mas sim realizar uma ligação entre os seus valores de guerreiro (normas e condutas éticas) que foram buscados pela cristandade para construir uma nova leva de cavaleiros, os Cavaleiros da Ordem, ligados a Deus, e consequentemente ligados a Igreja Católica.

Assim, buscamos compreender até onde os domínios da religião eram impostos na sociedade medieval, e como os novos valores da cavalaria, como a ética cristã e sua união com o código de conduta e honra dos cavaleiros, na verdade era um molde para aqueles que formavam a sociedade medieval.

Destacando a formação desse cavaleiro "perfeito" como sendo o homem a ser seguido, e como a igreja católica buscava "formar" um novo tipo de cavaleiro onde este seria um homem leal às praticas religiosas e tementes aos "castigos" divinos e que produziam uma sociedade marcada por elementos simbólicos como as instituições, Igreja, as armas e seus significados aos cavaleiros e o papel do cavaleiro como elemento marcante na sociedade medieval.  

Desta maneira, como afirma Duby em sua obra "As três ordens ou o imaginário do Feudalismo", a sociedade medieval era baseada em uma hierarquia simbólica, onde havia aqueles que "dedicam" sua vida a Deus, os oratores, aqueles que defendiam os pobres e menos favorecidos, os bellatores e por último, os laboratores  que trabalhavam para o "bem comum" de todos.

Duby relaciona mentalidade a ideologia, uma vez que fazem parte de todo o contexto da sociedade medieval, moldando os interesses daqueles que detinham o poder, no caso a Igreja Católica, que era interessada na continuidade dos seus interesses a partir da junção e propagação das suas crenças e dogmas.

Nesse sentido, é essencial em nossa pesquisa a perspectiva de que o livro da Ordem da Cavalaria além de constitui um modelo sobre a cavalaria, onde influência a cavalaria ao mesmo tempo em que era influenciado por ela.

Nesse sentindo, adotamos a perspectiva de Jean Flori, ao esclarecer que o conteúdo do conceito de cavalaria evoluiu ao longo do tempo assumindo conotações sociais que a aproximavam da vassalagem, do feudalismo, da nobreza, sem que possamos, todavia, confundi-la com nenhuma dessas noções.

 A função da cavalaria estava antes de tudo vinculada à idéia de serviço de natureza militar, o que explica em grande parte seu prestígio em uma sociedade na qual a guerra é fator constante.  

Ao utilizarmos Jacques Le Goff, verificamos sua preocupação em relacionar a vida medieval aos fenômenos religiosos caracterizados pela força política e religiosa do Catolicismo, que trazia no simbolismo o principal fomentador de uma realidade que "norteava" o homem medieval, estabelecendo limites a seus questionamentos e medos aos seus possíveis pecados. Assim poderemos tentar compreender como tal aspecto será importante para a construção da figura do bom cavaleiro.

Pelo exemplo do bom cavaleiro, a sociedade estaria estimulada a seguir seu modelo de comportamento cristão e alcançar suas virtudes, ponto crucial na obra do livro da "Ordem da Cavalaria", buscaremos com tais teóricos compreender como se dará tal fomentação da cultura/mentalidade da sociedade medieval guerreira, porém "humanizada".

A Sociedade Cavaleiresca, do historiador George Duby, é uma obra que vai nos fornecer subsídios altamente importantes acerca do ambiente do mundo da cavalaria, uma vez que ao fazer uma analise da nobreza francesa do período medieval, irá nos trazer aspectos sobre a origem da cavalaria e sua relação com a nobreza e a igreja.

A esta cavalaria, atrelada não só a igreja, irá se fortalecer no âmbito de proteção a outros nobres, onde a condição de cavaleiro, seja pelo fato de utilizar o animal cavalo, quer seja por defender o feudo, terá suas origens nas relações da aristocracia francesa dos séculos IX e X.

Com esse intuito verificamos na primeira parte do livro, uma intenção do autor em tentar demonstrar a apropriação do caráter de superioridade que a cavalaria irá formar na sociedade ocidental dos séculos XII e XIII, e também os aspectos culturais que irão dar suporte à inserção da cavalaria aos "grupos sociais" medievais e como as famílias, as linhagens de nobreza sustentaram a ideia de uma ideia de poder a noção de cavalaria.

 Neste âmbito, Duby, nos alerta para o quão dispendioso se tratava a formação de um cavaleiro, uma vez que para sustentar os animais, comprar as armas e armaduras, seria algo incompatível com os servos que não tinham acesso ao uso ou posse de tais bens. Seria a cavalaria algo voltado aos nobres, seus filhos ou até mesmo aqueles nobres que possuíssem apenas o titulo de nobreza, desterrados.

A nossa fonte de pesquisa neste trabalho será a obra do filosofo Ramon Llull, que entre os anos de 1279-1283 compôs o Livro da "Ordem de Cavalaria" que aborda a criação de um "cavaleiro ideal" abençoado pelos valores cristãos. Com esta obra, verificamos uma espécie de contribuição do autor com o propósito da Igreja em associar os cavaleiros somente a ela, ou seja, não deveriam combater em nome de outra Ordem que não seja a dos representantes de Deus na Terra, a Igreja.

O livro de Ramon Llull é fundamentado nas responsabilidades e funções voltadas a manutenção e defesa da fé católica, onde deveria existir um cavaleiro cristão livre dos pecados, arrependimentos e voltado principalmente para a valorização da Paz em nome da igreja, e assim atingir a salvação.

Em sua obra o filósofo, demonstra a existência de um ideal conservador da ordem social, e seu grande e inquestionável propagador seria a santa fé cristã, onde a religiosidade, também moldaria a formação dos cavaleiros, não só espiritualmente, mas socialmente.

Dessa forma, Ramon Llull, desenvolvia uma tentativa de transmitir à ideologia cavaleiresca cristã aqueles que buscassem seguir a vida de cavaleiro, e com esse intuito seu livro é iniciado com um epilogo que descreve um velho eremita que ao deixar de ser cavaleiro, ao cruzar com um jovem escudeiro não compreende como tal personagem não conhece as virtudes e os ofícios que um cavaleiro de Deus deve seguir por toda vida.

Através de seu livro, Llull, contribuiu com o propósito da Igreja ao associar aos cavaleiros, homens de armas, o papel de homens a serem seguidos e respeitados, pois além de proteger esses menos favorecidos, seguiam um código de valores que valorizava o cristianismo.